O processo Sócrates é igual ao dos submarinos?

O processo dos submarinos que atingiu a imagem de Paulo Portas tem algum paralelo com o processo que liquidou a reputação de Sócrates? Sim e não. Sim porque as violações de segredo de justiça provenientes da investigação e as interpretações sobre essas informações feitas por atores do palco mediático envenenaram o julgamento da opinião pública quer sobre Portas quer sobre Sócrates, embora com gradações e intensidades diferentes.
Não, os processos não são paralelos porque Portas nunca foi arguido, sai totalmente ilibado sem contestação relevante enquanto Sócrates, preso preventivo, terá de ser mesmo condenado para salvar a face da Justiça: se, por burrice inultrapassável do Ministério Público, acabar por ser libado, verá metade do país acreditar que os políticos manipularam os tribunais e “cozinharam” uma fraca inocência.
Paulo Portas, na mensagem de Ano Novo que elaborou para o CDS, politizou o seu caso – “Para alguns dos nossos adversários nunca foi a Justiça que esteve em causa: combatem o CDS de qualquer forma e de qualquer jeito. Nunca quiseram o CDS no regime, e querem o CDS fora do governo. É isto e não é mais do que isto.”
Para Sócrates, já se sabia, o caso é político pelas razões que explicou à TVI – “Este processo, pela sua natureza, tem contornos políticos. E digo mais: este processo é, na sua essência, político. No sentido em que tem a ver com o poder, os seus limites e o seu exercício: o poder de deter para interrogar e o poder de prender preventivamente pessoas inocentes.”
Para Portas a Justiça que o inocentou foi correta, apesar dos dez longos anos de investigação retribuídos, da sua parte, com “sobriedade. “A nós basta-nos o Estado de Direito, o respeito pelas suas regras e a justiça efetiva”, escreve. A queixa vai para os adversários que tentaram manipular o caso contra ele e para os jornais que não deram destaque ao despacho final do Ministério Público.
Para Sócrates a Justiça que o prendeu atropela a lei, inventa acusações e atua politicamente ao violar o segredo de justiça, ao proibi- -lo de defender-se nos media e ao usar os jornais para ganhar apoio popular.
Paulo Portas, anos e anos investigado, acaba ilibado quando está no poder e quando tem à frente da Procuradoria-Geral da República uma magistrada nomeada pelo seu governo. José Sócrates, sucessivamente investigado e não acusado, anos a fio, acaba preso quando já não está no governo e quando não tem Pinto Monteiro, que nomeou, a liderar o Ministério Público.
Coincidência ou (concordando afinal com a forma como os dois olham para os seus próprios casos) pura política?
in Diário de Notícias , 6 de janeiro de 2015

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